Sobre o blogue
"Conheci pessoas extraordinárias. Ouvi as suas histórias, os seus caminhos, as escolhas. Achei que talvez valesse a pena sistematizar esses encontros (que resultaram em entrevistas), e reuni-los num sítio onde estivessem sempre disponíveis, nas versões integrais (que, no essencial, coincidem com as versões publicadas em papel).
Há anos (são mais de 15 e menos de 20) que escrevo para jornais e revistas. Mais do que tudo, fiz entrevistas. Faço perguntas porque quero saber as respostas. Também porque é mais fácil a um jornalista freelance exercitar esse músculo. Mas pode ser que isto seja apenas uma parte, e não a mais significativa, da verdade. Talvez faça sobretudo entrevistas porque gosto de conhecer as pessoas num cenário de um para um, concentrar-me nelas, em quem são, ouvir a narrativa que fazem de si próprias.
(...)"
Anabela Mota Ribeiro
JAT Vou distribuir um questionário para chegar a essa conclusão...
Qual é a qualidade que mais aprecia num homem? Proust falou de "charme feminino"...
JAT Verticalidade, sensibilidade e bom senso.
E numa mulher? Ele mencionou "franqueza na amizade" – golpe baixo para as mulheres ou sagaz comentário?
JAT As mesmas. Porque haveriam de diferir?
Ternura, desde que acompanhada de um charme físico..., era o valor mais precioso nas amizades de Proust. E nas suas?
JAT Verdade, afecto e humor.
Vontade fraca e incapacidade para entender, foi a resposta que deu quando lhe perguntaram qual era o seu principal defeito. Partilha destes defeitos? E que outros pode apontar?
JAT Pois a minha vontade também não é muito forte, o que faz com que a inércia, a preguiça e defeitos do género persistam em incomodar-me.
Qual é a sua ocupação favorita? Amar, disse ele...
JAT A minha. Para além dessa, que me parece uma excelente resposta e ocupação, seria conhecer verdadeiramente o mundo.
Qual é o seu sonho de felicidade? A resposta de Proust é esquiva: não fala de molhar madalenas no chá e diz que não tem coragem de o revelar... Mas que não é grandioso e que se estraga se for posto em palavras. O que é que compõe o seu quadro de felicidade?
JAT Amor, contemplar um mar tranquilo, dias na praia, sentir a felicidade nos outros.
O que é que na sua cabeça seria a maior das desgraças? Proust respondeu, aos 20 anos: "Nunca ter conhecido a minha mãe e a minha avó". Mas aos 13 respondeu apenas quando lhe perguntaram pela maior dor: "Ser separado da mamã".
JAT Não gosto muito de hierarquizar desgraças. Há tantas que podem ser tão dolorosas que não gosto de pensar nisso.
Quando lhe perguntaram o que é que gostaria de ser, respondeu: "Eu mesmo", aos 20, e Plínio, o Novo, aos 13. As suas respostas seriam diferentes? Quem gostaria de ter sido aos 13 anos? E agora?
JAT Um miúdo muito mais aventureiro e extrovertido. E agora mantém-se a ‘ambição’ com a diferença de ser um ‘miúdo’ mais ‘crescido’.
Proust gostaria de viver num país onde a ternura e os sentimentos fossem sempre correspondidos. O país onde gostaria de viver existe deveras? Onde fica?
JAT Sou muito perfeccionista e por isso encontro muitos defeitos em todo o lado. O problema maior é o que nós, Homens, fazemos dos países. Sem isso, qualquer poderia ser ideal.
Quais são os seus escritores preferidos? No momento em que respondeu, Proust lia com especial prazer Anatole France e Pierre Loti.
JAT Variam conforme as fases da vida e mesmo dos dias. Shakespeare, Eça, Oscar Wilde, Ian McEwan…
E os poetas? Ele mencionou dois, e um deles faz parte das listas eternas: Baudelaire
JAT Não gosto de poesia. Pois, é um defeito do qual me esqueci há pouco.
Qual é o seu herói de ficção preferido? Aos 13 anos, Proust falou de Sócrates e Maomé como figuras históricas de eleição... E aos 20, referindo-se às mulheres, elegeu Cleópatra.
JAT Faz o ‘bem sem olhar a quem’, combate a corrupção, vê e ouve para lá do real… É O Super-Homem!!! (apesar de não gostar muito do outfit)
Quem é o seu compositor preferido? Aos 13 anos, escreveu Mozart, aos 20 Beethoven, Wagner, Schumann. Mas Proust não podia conhecer Tom Jobim ou Cole Porter...
JAT Esta, para mim, é sempre das questões mais complicadas. Imagino-me perante uma ‘catástrofe’ a ter que decidir salvar apenas um entre BACH, VIVALDI, CALDARA, HANDEL, MOZART, etc… Não sei se eu me salvaria…
Proust não foi contemporâneo de Rothko. E escolheu Da Vinci e Rembrandt como pintores favoritos.
JAT Eu também passo bem sem Rothko. A renascença italiana, a pintura inglesa do séc.XVIII ou a escola flamenga do séc XVII chegam-me.
Quem são os seus heróis da vida real? Ele apontou dois professores.
JAT Os meus são aquelas pessoas que sabem na hora qual o seu ideal de felicidade e o perseguem.
"Das minhas piores qualidades", respondeu o escritor da "Recherche" quando lhe perguntaram do que gostava menos. E no seu caso?
JAT De não ter a ‘vontade forte’ para tirar a carta de condução.
Que talento natural gostaria de ter? As respostas de Proust são óptimas: "Força de vontade e charme irresistível"!
JAT Sem dúvida o musical.
Como gostaria de morrer? "Um homem melhor do que sou, e mais amado".
JAT Com estas respostas, o que acrescentar?... No entanto, neste caso até retiraria o mais amado (tenho muita sorte). Ficaria muito feliz se conseguisse ter a consciência de que melhorei.
Qual é o seu actual estado de espírito? "Aborrecido. Por ter que pensar acerca de mim mesmo para responder a este questionário". Pensar em quem é traz-lhe aborrecimento?
JAT Confesso que algum, mas por outro lado é bom obrigarmo-nos (ou obrigarem-nos) a isso de vez em quando. Adiciona-nos perspectiva.
Proust era condescendente em relação às faltas que conseguia compreender. Quais são aquelas que irreleva?
JAT A mentira e as faltas de educação e de profissionalismo.
Por fim, preferiu não responder qual era o seu lema, temendo que isso lhe trouxesse má sorte... É supersticioso como Proust? O que é que o faz correr?
JAT Não sou supersticioso e corro pouco, o que aliás, com a idade, me está a preocupar…
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